TCU Brasil – Carta do Presidente da INTOSAI, junho de 2024

13/06/2024

Transição energética no contexto da crise climática

A energia é essencial para o crescimento econômico e o desenvolvimento social, abastecendo nossas casas, indústrias e sociedades. No centro da agenda global, ela desempenha um papel crucial no enfrentamento aos desafios de desenvolvimento sustentável da atualidade.  

O Acordo de Paris, assinado em 2015 durante a 21ª Conferência das Partes (COP21), foi delineado como uma estratégia global em resposta à ameaça das mudanças climáticas, no contexto do desenvolvimento sustentável e dos esforços para erradicar a pobreza. Um dos compromissos assumidos no acordo prevê limitar o aumento da temperatura a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais. 

Em linha com essa estratégia, a Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU), por meio de seus 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), estabelece no ODS 7 a meta de garantir acesso a energia acessível, confiável, sustentável e moderna para todos. 

Dados da Agência Internacional de Energia1 indicam que o setor energético é responsável por mais de 75% das emissões globais de gases de efeito estufa. Além disso, de acordo com a Agência Internacional para Energias Renováveis2, para limitar o aquecimento global a 1,5°C, será necessário reduzir as emissões de CO₂ e alcançar emissões líquidas zero no setor de energia até 2050. Isso requer um aumento significativo da participação das energias renováveis no mix energético global, de 16% em 2020 para 77% em 2050, e um investimento total estimado em USD 150 trilhões, com uma média anual superior a USD 5 trilhões, o que representa cerca de quatro vezes o valor atualmente investido. 

No entanto, o cenário global revela muitas desigualdades no acesso e na capacidade de pagamento pela energia limpa. O investimento em energia renovável continua concentrado em um número limitado de países e focado em apenas algumas tecnologias, com 85% do investimento global beneficiando menos de 50% da população mundial.  

A COP28, realizada em Dubai no final de 2023, apresentou o Primeiro Balanço Global do Acordo de Paris, concluindo que as atividades humanas, principalmente por meio das emissões de gases de efeito estufa, causaram um aquecimento global de cerca de 1,1°C. Esses impactos já são sentidos globalmente, afetando de forma mais severa aqueles que menos contribuíram para essas mudanças, com perdas e danos que aumentarão com o aquecimento. Além disso, as respostas de adaptação mostram-se fragmentadas, incrementais e desiguais entre as regiões, com lacunas significativas que continuarão a crescer. 

Considerando a relevância dos compromissos firmados pelos países, os níveis de emissões do setor de energia e a rápida aceleração dos impactos das mudanças climáticas, a conferência enfatizou a necessidade de ação urgente para manter a meta de limitar o aquecimento global, o que exige esforços cooperativos para mitigar o avanço, migrar para economias de baixo carbono e aumentar a resiliência aos impactos da crise.  

Transições energéticas justas e inclusivas são essenciais para reduzir emissões, aumentar a eficiência energética e promover equidade. Diante da urgência em lidar com a crise climática e a necessidade de investimentos tanto públicos quanto privados, as instituições superiores de controle têm um papel crucial em apoiar transições energéticas equitativas. Por meio de nossa atuação, podemos contribuir para fortalecer as estruturas institucionais, promover um ambiente propício para investimentos e políticas públicas eficazes e garantir transparência e responsabilidade, avaliando a integridade, eficiência e efetividade das políticas relacionadas às transições energéticas. Isso inclui fortalecer as instituições e práticas regulatórias, mitigar riscos financeiros e supervisionar iniciativas que visem aumentar os investimentos em energia renovável, especialmente em países em desenvolvimento e economias emergentes. 

Pesquisa recente conduzida pelo Grupo de Trabalho sobre Auditoria de Indústrias Extrativas (WGEI, em inglês) da Organização Internacional de Entidades Fiscalizadoras Superiores (Intosai), envolvendo 25 países, destacou os principais desafios enfrentados pelas ISCs na condução de auditorias sobre transição energética. Os resultados indicaram que as ISCs reconhecem sua competência nessa área, com várias já tendo auditado o tema nos últimos anos. Um exemplo é o Brasil, que em 2018 realizou uma auditoria piloto e uma coordenada no âmbito do Grupo de Trabalho de Auditoria de Obras Públicas da Organização Latino-Americana e do Caribe de Entidades Fiscalizadoras Superiores (GTOP/OLACEFS), com a participação das ISCs do Chile, Colômbia, Costa Rica, Cuba, Equador, El Salvador, Guatemala, Honduras, México, Paraguai e Venezuela. A fiscalização identificou melhores práticas e oportunidades de melhoria em políticas de energia renovável. 

No entanto, a maioria das instituições superiores de controle reconhece a insuficiência de sua capacidade técnica para lidar com os desafios da transição energética, devido à falta de equipes qualificadas, dados limitados e ausência de metodologias específicas. Portanto, é crucial fortalecer nossa expertise técnica para que possamos efetivamente contribuir com nossos governos por meio de insights e recomendações alinhadas com as metas climáticas, promovendo o desenvolvimento sustentável e a cooperação global. 

Sob a presidência do Brasil, o G20 elegeu a promoção do desenvolvimento sustentável como uma de suas prioridades, abordando suas dimensões econômica, social e ambiental, incluindo as transições energéticas. Nesse sentido, o SAI20, liderado pelo TCU e aberto a todas as instituições superiores de controle, tem buscado impulsionar essa discussão e contribuir para esse esforço global, trazendo ao debate questões fundamentais como governança, regulamentação, transparência e accountability, com o objetivo de catalisar mudanças significativas para um futuro mais sustentável. Nessa união de esforços, a cooperação entre as ISCs é fundamental para firmar nosso compromisso de incentivar e promover políticas públicas mais eficazes e responsáveis, assegurando prosperidade e bem-estar a todos. 

Juntos, podemos contribuir para a construção de um ambiente de governança mais robusto e transparente, essencial para enfrentar os desafios urgentes e complexos da atualidade.